terça-feira, 15 de abril de 2014

O sono dos sonos



O dia estava nublado o que dava uma aparência árida ao parque de arvores longas. Uma brisa gelada produzia um baixo assovio que viajava por entre as arvores, mas ninguém escutava apenas o Senhor Davi. Eram poucas as pessoas que visitavam o lugar, alguns mais do que gostariam. O chão estava lamacento graças à fina chuva que caíra perenemente a noite toda. O senhor Davi saboreava aquele lugar. O vento, as arvores e até o céu cinzento, dava uma aparência poética ao lugar, na opinião dele.


Uma lagrima escorreu pelo seu nariz e foi sugada pela terra assim que tocou o chão. Depois da primeira ele não conseguiu conter mais nenhuma. Ele tentava, mas era inevitável sentia falta dela, mesmo depois de trinta e cinco anos. Casou-se cedo e a perdeu cedo, cedo de mais em sua opinião. O coração acelerou e ele sentiu os músculos da faringe incharem dificultando a passagem do ar. Seus longos e morenos dedos tiraram do bolso do casaco uma pequena bombinha. Sua mão tremia, mas não o suficiente para impedi-lo de aspirar o remédio.

O coração acalmou-se.

Davi olhou em volta. Aquele lugar se tornara para ele um lugar de paz tranquilidade. Seus filhos diziam, nos primeiros quinze anos após a morte da mãe, que era mórbido o pai sentir prazer em passar horas em um cemitério, mas com o passar do tempo aceitaram que ele estava feliz, era a maneira que ele achara de continuar vivendo com sua amada. Quando eram crianças seus filhos o acompanhava. A pequena Lucia sempre levava uma carta com desenhos e suas primeiras frases escritas sozinhas. Davi sempre as queimava, sem ao menos lê-las, “São segredo meus e dela, coisas de menina!” Lucia ralhava sempre que ele ameaçava abrir uma ou outra. Amanda sempre o obrigava a comprar flores de todos os tipos e cores, a menina tomara para si a missão de tornar o tumulo da mãe o mais belo e colorido daquele lugar cinzento. Bruno não gostava de ir, aquilo só aumentava sua dor. Ele era o único que tinha idade para se lembrar do corpo da mãe dentro do caixão, Davi sempre tentava fazer algo diferente para que ele fosse, mas o garoto se fechava dentro de si. Davi o abraçava e deixava à escolha do filho. Mas naquela manhã estava só. O tempo passou e as três crianças cresceram e começaram a ter seus próprios problemas, suas próprias batalhas.

Ele olhava fixamente para o bloco de mármore cravado no chão. Ele lhe falava palavras que podiam ser ouvidas apenas pelo coração.

Tereza G. Bruno
             *1949         +1979

Sempre que estava ali ele fechava os olhos e se lembrava da linda mulher que ele chamara de esposa. A pequena foto incrustada na pedra branca mostrava uma linda mulher, tinha bochechas rosadas, lábios finos, olhos negros e cachos dourados. A ela Davi entregara a vida. Por isso aquele lugar não lhe trazia um gosto amargo à boca ou um vazio na barriga. Ali estava com ela. Embora sempre a visitasse Davi viveu uma vida feliz, feliz para seus filhos e para ele. Essa fora a maneira que achara de honrar tudo o que prometera quando lhe disse sim no altar.

O vento soprou gelado fazendo um calafrio percorre sua espinha. Ele aconchegou a lapela do palito quadriculado, arrumou a boina marrom que escondia sua calvície e fincou o guarda-chuva no chão abrindo um profundo sulco na lama.

-Ela era bem bonita! –Disse uma doce voz feminina. A dona da voz se aproximou sem que o velho notasse.

Davi a esquadrinhou de cima a baixo. A jovem na casa dos trinta anos tinha um rosto pálido com feições delicadas, lábios rosados e miúdos, seus olhos eram cinzentos e profundos, como se já tivessem visto muito mais que três décadas. Seus cabelos negros caiam sobre o ombro como uma cascata. Ela vestia um vestido feito com um tecido de veludo negro com detalhes dourados na curvilínea cintura.

-Era sim. –Ele sorriu após responder carregado de orgulho. –Lembro-me de seus sorrisos como se fosse ontem.

-Era feliz? –A voz da mulher era doce e reconfortante.

-Sou feliz! Mas ao lado dela era muito mais que isso.

-Sabe? O maior defeito do ser humano é a eterna busca pela felicidade.

-Ela não é achada. –O velho sorriu e assumiu um tom mais amistoso, como se já conhecesse aquela mulher de outros tempos.

-Não! A felicidade não existe, não antes da morte. –Ela fez uma pausa para expor melhor seu pensamento. –O Ser humano experimenta bolsões de alegria, um sentimento semelhante, mas passageiro.
-Eu sou feliz.

-Sim, e agora será por toda a eternidade.

-Quando te vi ao lado de Tereza há anos você tinha uma aparência sombria e agora a vejo bela e simpática, não a temo por quê?

-A morte tem muitas faces. O fim sempre é o mesmo, mas as formas de partir são diferentes. Sou bela e amistosa para aqueles que cumpriram sua missão. Sou sombria para aqueles que se descuidaram e receberam minha visita repentina. Sou cruel apenas com aqueles que ceifam a própria vida.

Um silencio se fez entre eles, ambos ficaram a observar a lapide de Tereza.

-E para ela? Foi sombria ou bela como esta agora.

-Ela achou que eu era um dos altos anjos do senhor. –Davi sorriu mais uma vez.

-Então? Chegou minha hora?

-Não. Não se preocupe, ouvira liras tocando quando ela chegar.

-Então caminhe comigo velha amiga e conte-me mais sobre seus caminhos.

A mulher de cabelos negros caminhou com o velho como se fosse sua neta. Segurou-o pelo braço e caminhou pela alameda principal que levava à saída do cemitério.

Por coincidência ou Perspicaz manobra do destino Amanda levou a filha para lhe dar um beijo, já que a escola era próxima da casa do avô. Lucia e Euron, seu marido. Foram mostrar o netinho que dentro de três meses viria ao mundo. Bruno passou à tarde com o pai tomando café e falando sobre a vida e as dificuldade impostas por ela.

-A vida é como uma bela rosa, sempre terá espinhos que irão machucar sua mão, mas se não descuidar da planta ela ira florir e produzirá flores mais belas.

-Andou lendo de novo pai?

-Não! Apenas conversei com uma velha amiga.

Quando a noite caiu, Bruno adormeceu no sofá da sala. Davi se preparou normalmente para uma noite de sono, para o mais importante deles. Quando se deitou e fechou os olhos ouviu um barulho como frufru de um vestido, quando voltou a abrir os olhos viu um lindo ser cercado de luz. Uma baixa melodia de lira tomara conta do lugar.

David sorriu e disse:

-Realmente pareces um dos altos anjos do senhor!

-Fim-





Plínio Rezende

2 comentários:

  1. É um belo conto. Só acho que você devia ter sido um pouco mais cuidadoso com a linguagem, principalmente nos primeiros parágrafos (e não estou falando de ortografia ou gramática).

    ResponderExcluir

leia tambem